Como o imaginário molda o modo de ver o mundo, e como a cultura, em silêncio, forma o horizonte de consciência de um povo e o destino de cada pessoa.
Existe algo dentro de cada pessoa que não se vê, mas que decide quase tudo o que ela faz. É como um mapa invisível, que mostra até onde conseguimos enxergar o mundo e também onde ele termina para nós. Esse mapa é o nosso imaginário — o conjunto de imagens, lembranças, sonhos e ideias que formam a maneira como compreendemos a vida. Quase ninguém fala dele, mas ele está por trás de cada gesto, de cada escolha, de cada medo e esperança.
O imaginário começa a ser construído muito cedo, por vezes antes mesmo que saibamos pensar com clareza. Ele nasce das histórias que ouvimos, das músicas que cantamos, das pessoas que admiramos e das experiências que vivemos. Quando uma criança cresce ouvindo que “a vida é luta e nada vem fácil”, aprende a ver o mundo como um campo de batalha. Já outra, que escuta “a vida é um dom e cada dia é um presente”, caminha com mais gratidão e calma. Nenhuma das duas está errada por completo — mas cada uma enxerga apenas o que seu imaginário permite.
Você já reparou como algumas pessoas parecem ver possibilidades onde outras só veem paredes? Isso acontece porque o “horizonte de consciência” — aquilo que somos capazes de perceber e compreender — depende do tamanho e da qualidade do nosso imaginário. Quando o horizonte é curto, vivemos presos em um círculo pequeno, sempre repetindo as mesmas ideias e reações. Quando o horizonte se alarga, começamos a entender melhor o outro, a enxergar o sentido das coisas e até a suportar o sofrimento com mais sabedoria.
Mas o imaginário não se constrói sozinho. Ele é moldado pela cultura — esse tecido invisível que une um povo e dá forma ao modo como ele vive, fala, trabalha e sonha. A cultura é como o solo de uma plantação: dela brotam nossas crenças, nossos costumes, nossos valores. Por isso, a cultura não é apenas algo “bonito” ou “interessante”; ela é vital. Quando uma cultura é sadia, as pessoas se fortalecem; quando se corrompe, o povo enfraquece.
Pense, por exemplo, em uma sociedade que valoriza apenas o dinheiro. Nela, o imaginário coletivo se enche de pressa, de competição e de desconfiança. As pessoas passam a medir o próprio valor pelo que têm, e não pelo que são. Aos poucos, o horizonte de consciência vai se estreitando: o bem se confunde com o útil, e o belo com o caro. Já em uma cultura que cultiva a família, o respeito e a fé, o imaginário cresce em direção àquilo que dá sentido, não apenas prazer.
O horizonte se amplia, e a vida ganha profundidade.
O curioso é que esse processo não segue apenas um sentido. A cultura forma o imaginário, mas o imaginário também sustenta a cultura. Quando muitas pessoas acreditam nas mesmas imagens — por exemplo, na importância da honra, da verdade ou da solidariedade — essas ideias se tornam vivas e mantêm o modo de vida de um povo. É como se cada mente fosse uma pequena chama que, junto às outras, ilumina o caminho coletivo. Mas, quando as chamas se apagam, o caminho escurece.
Você já parou para observar quais imagens guiam a sua vida? Quais são as ideias que você repete sem perceber? Quais histórias, músicas ou palavras moldaram o seu modo de ver o mundo? Em muitos casos, descobrimos que várias delas nem são nossas — apenas as herdamos. E talvez o verdadeiro amadurecimento comece quando passamos a examinar com cuidado o que carregamos dentro.
Ampliar o imaginário não significa decorar palavras difíceis nem estudar livros antigos. Significa aprender a olhar de novo para as coisas simples: o nascer do sol, uma conversa, o silêncio de quem sofre, o gesto de quem ajuda. São essas pequenas experiências, quando vividas com atenção, que vão alargando o horizonte e afinando o coração.
Quando uma pessoa se torna mais consciente, ela transforma o seu olhar. Ela se torna uma força de ação que pode - mas não necessariamente consegue - influenciar os outros. Por isso, cuidar do imaginário é cuidar da cultura; e cuidar da cultura é cuidar do futuro. Um povo que esquece o valor do belo, do verdadeiro e do sagrado acaba perdendo o rumo — e, quando o rumo se perde, a liberdade se torna apenas um nome bonito.
O primeiro passo é simples, mas exige coragem: começar a perceber a realidade do que acontece. Escutar mais, julgar com honestidade. Refletir antes de repetir. E perguntar a si mesmo, de vez em quando, o que está alimentando dentro de si. Porque é justamente aquilo que alimentamos — com palavras, imagens e gestos — que um dia se tornará a nossa cultura.